
Quero estar aqui, neste canto de mim, de onde te olho de longe.
A ti que apenas adivinho os contornos, e saboreio os teus pedaços públicos, como tantos outros o fazem... deleitar-se-ão, tal como eu, tentando adivinhar-se nas palavras que de ti se soltam, nos gestos que deixas no ar, como traços de leve perfume?
Quero-te.
Pois, quero-te.
Não sei se lhe chame desejo primário, fantasia talvez, solidão de uma noite sem estrelas, o corpo quente nos lençóis de linho branco, os dedos percorrendo a pele sem encontrar descanso no prazer fictício e fugaz da intimidade a sós...
Dar-me-ia a ti se te tivesse no espaço entre o corpo e uma parede? O arfar do peito em crescendo, a língua em espera, degustando os lábios vermelhos, olhar fixo prendendo-te no amplexo desejado, sem te tocar, as mãos a adivinhar-te os contornos, os músculos por debaixo das vestes com que te cobres do Mundo... atrever-me-ia eu a quebrar as regras, a saltar no vazio, a sugar-te em mim? E tu, querer-me-ias assim, com as histórias que me sulcam o rosto e as curvas com que o tempo me marcou?
Paga-se o preço da dádiva com que moeda estrangeira?
Com que língua me falas tu? Louca que estou, pensando que é a mim que entrelaças em pontos finais, vírgulas e consoantes. Louca de pedra e cal, ancorada a esta história inventada.
Deixo-me estar, neste canto de mim.
Sabe bem entregar-me em pensamento, sem juízos nem juízes.
Só a ti permitiria que me condenasses a uma fogueira conjunta.
A parede fria, o corpo quente. A distância de um beijo, aquele que tudo muda.